O estrondo rasgou o ar como um trovão forjado pelo acaso. O impacto primeiro foi entre dois carros, um choque brutal que empurrou a violência adiante, arremessando uma moto para longe. O piloto foi lançado como uma marionete sem fios, um homem reduzido a trajetória e gravidade. Por um instante, ele flutuou, uma figura contra o céu cinza, até que seu corpo encontrou o metal impassível de um ônibus. A colisão foi o segundo ato da tragédia. O terceiro veio quando ele caiu, um peso morto sobre o asfalto, ainda vivo apenas o suficiente para assistir ao próprio fim.
Fiquei ali, congelado, não por medo, mas por um tipo de espanto que só se sente diante daquilo que transcende o ordinário. Ele respirou uma última vez. Eu vi. O último sopro, o adeus invisível que se perde no vento, sem aplauso, sem cerimônia.
E então, tudo fez sentido. O absurdo da existência revelou-se como um espelho brutal. Passamos a vida temendo monstros e mitologias, mas esquecemos que o maior horror é a banalidade da morte, sua simplicidade cruel. Um momento estamos, no seguinte, não mais. Como um pensamento que se forma e se dissolve antes de ser dito, como uma vela que se apaga sem resistência ao próprio destino.
A vida, essa entidade tão sagrada, não passa de um cálculo frágil entre o tempo e o acaso. E nós, que nos acreditamos importantes, que nutrimos sonhos, medos e amores, não somos mais do que acidentes esperando sua hora. A única certeza é que o chão nos aguarda, indiferente.
O trânsito seguiu. As buzinas voltaram. O mundo não parou. Nem mesmo por um segundo. E ali, naquela continuidade implacável, compreendi: a vida não se importa com nossa existência, e talvez seja exatamente isso que a torne tão insuportavelmente bela.
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