20 de jun. de 2018

Canto XXI


130. Já (Estácio) se inclinava para abraçar as pernas do meu guia, mas este o impediu, bradando: "Irmão, tal não intentes, pois és sombra o que de mim vês".

133. E o outro, erguendo-se: "Bem podes medir o profundo respeito que a ti eu voto pelo engano ora cometido de querer, vaidade humana, tratar sombras como se matéria fossem".


("A Divina Comédia", Dante Alighieri)

14 de jun. de 2018

Canto XVI


118. Grande cautela e igual prudência devem ter os homens quando lidam com os que enxergam não somente as coisas, mas percebem também o que se pensa. Pois me disse o mestre: "O que tens no pensamento, logo mais verás realizado. Surgirá depressa o que espero".


("A Divina Comédia", Dante Alighieri)

7 de jun. de 2018

Vulturino


Faça da solidão a tua cruz
carregue-a e deixe-a carregá-lo
permita escorrer o sangue sagrado
no ébano divino que te conduz

sirva do horizonte louvar sepulcro
faça do teu espírito as pompas
tal necrópole que sustentará
a verdade dentro das sombras,

Uma estrela morta pode ser
tão luzente e radiante quanto
a presença dos deuses correntes

ainda que desencarnados
somos todos resplandecentes...


(Cássio D. Versus)

6 de jun. de 2018

Membrana


Sinto atenuar as duras feições enigmáticas no ar estático
sobre despenhadeiros urdidos contra reminiscências
descobertas pouco antes do recomeço universal,
pragmático
sem condolências
por alguns infinitos, selvático transcendental

Minhas mãos extenuadas desenterram luminosidade
do hediondo cansaço causado pelas plagas empedernidas,
propósito que se repete através dos tempos, sem saídas
rasga a lei natural diante tirânica minoração tão nu retarde

Passado enceguecido de lânguido arrepender-se,
o que sofro é ansiedade adaptada, perniciosa,
moléstia das emoções e pensamentos, ambiciosa,
sistema nervoso avulso e louco e meliante a render-se

Dos males no âmago, vicissitude, reprimenda da alma
contra o corpo, indisposto, aos sinais da imaginação,
transmite a inquieta balança encarcerada vozeria e malva
inadiável como a sentença de um julgamento sem vazão...

Deus criou a mente, o diabo, coração.


(Cássio D. Versus)

Saint Lazare



Desdobrava-se a noite, lentamente. A escuridão atenuada pela penumbra esbatia as suas grandes asas. Lá, onde a Terra esposa o céu, despontava o Sol como um globo incandescente; a madrugada embalsamava-se dos perfumes silvestres, despertando as avezinhas e transmitindo vida e encanto a todas as coisas da Natureza.
A cidade estava ainda submersa nos vapores do sono. Nas ruas desertas, só os trilos das patrulhas e os primeiros apitos das fábricas quebram o silêncio da grande metrópole...


("O Beijo da Morta", Celestina Arruda Lanza)