18 de mar. de 2015

A Saída Morreu


a saída morreu
e esqueceu
de me levar

só há entradas
nessa estrada
que é existir

possível somente vir


(Cássio D. Versus)

Luz Azul


O anjo ri em seu interno
céu é sonho de consumo

e que humano é todo grumo
coisa de quem vive a ser inferno


(Cássio D. Versus)

Espelho & Sombra


tenho delinqüido
por uns bairros que morei,
em meus sonhos,
pesadíssimos tormentos
agora esboçam
um tal vazio e tão ex-acolhimento.


(Cássio D. Versus)

Lacustre (II)


uma trovoada
ataca

e tanto faz
um feito vil
de avenida
corrompida
e larga

de mente
deprimida
e vagarosa

espero que
algum lugar
- qualquer lugar -
esteja a deprimir-se
de tanta falta
que faço a ele...


(Cássio D. Versus)

Cáfila dos Pensamentos


poesias encarnadas
e o viciante veneno
que é doce,
- amargo ainda fosse -

textura ímpar, infernal
e a febre empolgante
que é obliterada
- marginal emboscada -

passaporte corrupto
e a beirada magra
que é rude,
- se doer é juventude -

perdição umedecida
por lucidez impostora
que é nobre
- melhor só a morte -


(Cássio D. Versus)

Paraíso


rouba-me,
leve este amor franco daqui
e escandalize meus descuidos.

Queira-me apenas de partida, -
embevecido
para outras terras, águas, ares.... irei.
Sorrindo co'a sempre bem-vinda fantasia acometida
... do saudoso éden (corpo teu) que visitei.

E fico feliz com o meu futuro
de passados vagabundos (feito eu),
calibrados e matadores,

deixo contigo
a mais suave arte dos lunáticos:
um pretérito inteiro de paixões agridoces.


(Cássio D. Versus)

(Des)esperando


enterrado
sufocado
castigado
condensado
premido
fatigado
depresso

e conciso

como amar a um assim ser

sendo tu então encantamento
real e esplendente
co'a tua renovadora paixão?

Acreditando piamente
em um desastre sem precendentes
a esbarrocar-se pelo chão

um eu amado e não questionado
sobre possuir mente desatinada
e no peito um ultrajado coração


(Cássio D. Versus)

Segredos


não há nada
acima das nuvens
do céu
que não se encontre
abaixo dos grãos
da terra


(Cássio D. Versus)

prende o céu numa redoma


prende o céu numa redoma
de vidro não batizada
potestade
alvedrio em coma
misantropia iluminada

me encontra uma vida passada
tudo o que perdi parece meu
desejos velhos minha pousada
aos meus pés quem me venceu

vou assim pra todo lado
com muita fé no sentir e vejo
o meu marasmo virar prado
a cada contato a cada ensejo

e mesmo assim há incompletude
mais faleço que renasço
sonho agora o que não pude
vivo a ser tempo sem espaço


(Cássio D. Versus)

Manhã passa...


Uma nuvem, antes com frequência tão longe, agora se aproxima e esconde a ansiedade da minha ressaca. Comediante dos céus. Lágrima e suor despencam formando aqui um deus sem carne feito só de casca e osso. A verdade é miragem. Só há deserto e areia de grãos que mentem suas causas no universo em que adormecemos, distraídos com nossas pálpebras pesadas...

Plena memória a cuspir sangue nas alturas...


(Cássio D. Versus, Jan/2015)
 

15 de mar. de 2015

21:00


tope do prédio e,
duas mãos balançam no ar,
não sei se me pedem para ir
não sei se me pedem para ficar

conheço quem os braços agita
como quem os balança me conhece também,
lembro bem logo antes que transmita
a mais árdua paixão me tornando refém

concedo adeus dizendo "não posso",
me afogo em pesares de tanto que sinto,
ela ainda lá aguardando os destroços
de alguma outra escolha oposta ao instinto.


(Cássio D. Versus)

13 de mar. de 2015

O tempo que nos resta


De quantos anos mais você precisa?
Seja razoável e, por favor, dispa-se
de equivocadas pretensões.
Não se trata de reinventar o mundo,
salvar a humanidade,
ou dar sentido à existência.
Apenas avalie seu corpo
e o tamanho do seu desejo.
De quanto mais tempo você precisa para arfar
pulsar
vibrar
fremir?
Talvez você não precise mais deste tempo.


(Mariza Tavares)

Sobre nós


cáusticos
cítricos
críticos
lúbricos
mágicos
únicos
sísmicos
trágicos
cômicos
somos cômicos.


(Mariza Tavares)

Boy meets girl


Humildemente,
eu reconheço minhas limitações
- ou pelo menos parte delas -
e peço que você me explique:
afinal, é realmente imprescindível
este arquejar incessante em busca de comunhão?
Por que as coisas não podem simplesmente
funcionar?
Boy meets girl, girl meets boy
and they just feel good together.
Anything else is bullshit.
 
 
(Mariza Tavares)
 

8 de mar. de 2015

Mrs. Henderson Presents


(...)

"Dançar para a vida, porque os dias serão cinzentos e ensolarados, 
as dores doerão, os amores deixarão suas marcas, boas e más, 
as saudades serão sentidas, os risos, compartilhados, 
mas teremos dançado a vida, e isso é tudo o que importa agora."


("Degraus", Monica Pinto da Veiga)

Aquele Que Só Enxerga o Que Quer


(...)

"Mentes exaustas, enfastiadas, enfraquecidas, aborrecidas, cansadas, mentes exaustas, exaustas, exaustas, que repetirão seus mantras até que tudo seja pó." 


("Degraus", Monica Pinto da Veiga)

Elegia a Meu Primo


(...)

Se ao menos eu tivesse certeza, priminho,
que vives, neste momento, a mesma vida sem prazo,
dos rochedos e do rio!
Espera que irei com outro corpo
pesquisar as nuvens e o céu,
e ao te encontrar - por certo me recolherás.
Habitaremos um dia a mesma constelação
e de lá ficaremos a zelar, para sempre,
o Universo.


("Elegias", Yone Rodrigues) 

O Suicida


(...)

Lívido e inocente, mergulhaste.
Será a morte, acaso, a simples continuação
da noite?
Tu, que do mar vieste,
não aprendeste com as marés
a de novo tentar?

Imagino o que tanto ensaiaste:
o inútil passeio, o encontro falido,
o cigarro negado, a espera silente,
aquele cão que não te reconheceu.

Uma palavra mágica e serias hoje
um ser vertical.

Participo, estática, da friagem
que te habita.

Chamo-te pelo nome de infância.
Convoco pirilampos para o teu olhar.
Mas pertences, agora, ao oceano.

No tombadilho repousas.

Devo içar as nuvens, soltar teu barco,
rumo à praia do sono que te aguarda.
A lua, lanterna dos navegantes,
te guiará.

Quando chegar a maré alta, hás de ancorar
lá, onde os pássaros de sombra se calam,
lá, onde as flores de sombra se abrem,
lá, onde os habitantes de sombra
por certo te recolherão.


("Elegias", Yone Rodrigues) 

Última Elegia


(...)

Para onde seguirão os mortos de amor,
os silenciosos que o inverno expulsou da haste
e no oceano se perderam, em tamanha navegação?

Para onde seguirão, de bruma vendados,
esses, os amantes da noite, calados
sob o teto de cipreste
e a colcha de tépido azul?
Lágrimas de mármore choram.
Flores de mármore respiram.

As palavras,
deixaram para os que são da terra
e nela permanecem, enraizados,
que eles, os mortos, se comunicam
pelas nuvens, como os raios.

É grande o mundo. Contudo ficastes
ao relento do vosso amor desencadeado.

Nenhuma varanda para a vossa imaginária serenata.
Olhai as dunas,
que seriam vosso travesseiro,
as conchas,
remetendo ao mar vosso recado inviolado.
Olhai as grutas, as quintas, as fontes,
os jardins, intocados e eternos,
as estradas só povoadas de estrelas!

Hoje o girassol, relógio sonolento,
marca as horas do nunca despertar
e a chegada das andorinhas,
pesadas de azul e primavera.

Enquanto a chuva molha vossos sonhos,
eu contemplo vossa face definitiva
e balanço a rede
na praia infinita onde repousais.


("Elegias", Yone Rodrigues) 

6 de mar. de 2015

Ida e Volta


Para quem vai
o relógio faz
tic tac.
Mas para quem vem
(ouça, verifique) 
o relógio faz
tac tic.


(José Paulo Paes)

3 de mar. de 2015

provaremos as ilhas e o mar


sei que em alguma noite
em algum quarto
logo
meus dedos abrirão
caminho
através
de cabelos limpos e
macios

canções como as que nenhuma rádio
toca

toda tristeza, escarnecendo
em correnteza.


(Charles Bukowski)

Bukowski Poemas Blogspot

ignis fatuus


a única solidão é
sono ou morte
nós não éramos inteligentes o bastante
gentis com os outros e cruéis para si mesmo
quando pedimos a nós mesmos por misericórdia
e isso foi negado

a mais sagrada privacidade permanece
nos esperando
e tudo que foi
incompreendido ou abandonado
se reunirá

deixe meu fracasso ser sua sorte
isso que foi um quebrado
e descuidado
erro

que seja conhecido
que saber sua própria morte
é morrer duas vezes
uma vez realmente
e então, quase nada

que seja conhecido
que não há nada tão feio
em tudo que é tangente
como a besta humana
um truque definido contra o sangue de sua alma

que seja conhecido
que a solidão é a única
misericórdia
e a única
amante

que seja conhecido
que um homem não precisa ser Cristo
para ser crucificado

que seja conhecido
que um homem pode ser
crucificado
a cada dia
a cada momento
a cada respiração
de sono e vigília
e então ser atormentado novamente

que seja conhecido
que um homem pode morrer
e morrer
e morrer
e morrer
e ainda sentir a dor
e saber que está morto
e ainda sentir a dor
e saber que não há nada que ele possa fazer
e ainda  sentir
a dor
que seja conhecido

que seja conhecido
que os templos não são nada
e os sinos não são nada
e a fama não é nada
e a vitória não é nada
e o sexo não é nada
e que a solidão traz loucura
e a multidão traz loucura
e bebem  e comem o corpo
como um tigre
que não há nenhuma voz para falar com
nenhum ouvido para ouvir
que seja conhecido
que haverá outros homens como eu
levantados  para a boca dos leões
queimados  por falsos amores
enganados por gentileza
alvejados pelo intelecto
tontos por ramalhete
sacrificados para o lucro
utilizados como mão de obra barata
e estes serão os mais gentis dos acontecimentos
em comparação com o que vai entrar no olho
e na orelha
e no cérebro
e escoar para as entranhas para começar seu
trabalho de morte
eu tenho pena que todos esses meus irmãos
que vão me seguir nos séculos
Incapazes de amar, porque não há nada para amar
Incapazes de matar, porque não há nada vivo
Para sempre pendurados e
sangrando e tontos
Pela besta
humana
as paredes
os jardins
o sol
as flores
os beijos
as bandeiras
os mares
os animais
a comida
os licores
as pinturas
as sinfonias
tudo inutilidade

que seja conhecido
que a maioria dos homens
adoram quando podem ver
e eles vêem uns aos outros
e eles adoram isso
porque eles vêem muito pouco

que seja conhecido
que eu sou amargo
e condenado
e cansado
e inútil

que seja conhecido
que quando esperança final se vai
lá permanece, mas olhando para a dança
e observando a relação fraca
dos idiotas
com muito pouco anotações

que seja conhecido
que eu estou morto
mas não existe raiva

que seja conhecido
que a maioria dos homens estão mortos
muitos anos antes do enterro

que seja conhecido
que muitos homens morrem na infância
que muitos homens nascem mortos
embora as suas partes se movam
e fazem som
e crescem
e avançam
no comportamento adulto
e fazem as coisas da
civilização

Que seja conhecido
que estes homens nunca existiram
e que seus funerais
foram enormes farsas
e também as lágrimas mortas
para o já morto

que seja conhecido
que os próprios vermes
estavam mais perto da verdade
na medida em que
não
choram

que seja conhecido
que o nascimento não é santo
que a morte não é santa
que a vida não é santa

que seja conhecido
que eu tenho sangrado sem coroas
que eu vou sangrar em um momento
que eu vou sangrar para sempre
vermelho
vermelho
vermelho
e os falcões vão dançar
dentro dos meus ossos
e regozijar

que seja conhecido
que eu não morra pelos pecados do homem
mas que eu morra pelo o quê o homem é
e para o que eu quase fui
eles- muito pouco de qualquer coisa
em mim mesmo levantou o suficiente
para ver o horror
o adoecer
e enlouquecer
e murchar

não tome como pessoal
o que eu digo sobre a vida
completamente
ou o homem
completamente
a não ser que
em outro plano
você se considera
um defensor da vida e do homem
o que é apenas uma outra fraqueza natural das espécies
como um rato guardando seu ninho
e para o qual
eu não posso te culpar totalmente

a única solidão é a morte
mas não esta morte
não esta morte
não
esta

morte.


(Charles Bukowski)

2 de mar. de 2015

A Gangorra das Sombras


Resta o ópio da imanência imaculada,
(des)espero do sol seu pôr -
O tudo é lado agro de ser nada.

(Minha existência é uma gangorra
com Deus e o Diabo nas pontas,
não importa o quanto eu morra...)

Dói tanto quanto a tua minha dor secreta,
e quando juntas estão nossas feridas
parecemos sofrer menos toda a miséria,

e então, sobejo assim, como os poetas
que dizem aos mares "morrer de amor",
no entanto vivem de palavras meras.


(Cássio D. Versus)

Sonhos da Menina


A flor com que a menina sonha
está no sonho?
ou na fronha?

Sonho
risonho:

O vento sozinho
no seu carrinho.

De que tamanho
seria o rebanho?

A vizinha
apanha
a sombrinha
de teia de aranha . . .

Na lua há um ninho
de passarinho.

A lua com que a menina sonha
é o linho do sonho
ou a lua da fronha?


(Cecília Meireles)

Ou Isto ou Aquilo


Ou se tem chuva e não se tem sol
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo . . .
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.


(Cecília Meireles)