13 de fev. de 2013

Alucinação


No baile, esbelta e branca, o seu olhar nevoento
Fitou-me; e como à pluma arrasta a ventania,
Insano amor, paixão de morte, num momento,
Minha alma arremessou num inferno de agonia...

Falei-lhe, foi delírio e clamor de lamento;
Quis vê-la em seu palácio, e a Esfinge altiva e fria,
Com a sombra de um sorriso e um vago gesto lento,
“O seu palácio, diz, somente a morte o abria.”

Sigo-a perdido e louco, em seu jardim me oculto,
Vejo-a entrar no castelo e sumir-se o seu vulto;
Tento alcançá-la, corro; acho aberta uma porta,

Entro, a sala é mortuária, em torno o crepe esvoaça.
– “Onde a Senhora? – Indago a um fâmulo que passa.
– “Repousa em terra santa. Há dous dias que é morta”...


(Victor Silva)

Solar Encantado


Só, dominando no alto a alpestre serrania,
Entre alcantis, e ao pé de um rio majestoso,
Dorme quedo na névoa o solar misterioso,
Encerrado no horror de uma lenda sombria.

Ouve-se à noite, em torno, um clamor lamentoso,
Piam aves de agouro, estruge a ventania,
E brilhando no chão por sobre a relva fria,
Correm chamas sutis de um fulgor nebuloso.

Dentro um luxo funéreo. O silêncio por tudo...
Apenas, alta noite, uma sombra de leve
Agita-se a tremer nas trevas de veludo...

Ouve-se, acaso, então, vaguíssimo suspiro,
E na sala, espalhando um clarão cor de neve,
Resvala como um sopro o vulto de um vampiro.


(Victor Silva)

O Farol


Na amplidão do mar alto entre as vagas se apruma
O vulto do farol como uma sentinela;
Estardalhaça o vento, e a rugir se encapela
A água negra do mar em turbilhões de espuma.

Enche a trágica noite, atroa e se avoluma
Um insano clamor nas asas da procela: É a morte!
E ao temporal que as vagas atropela
Rodopiam as naus na escuridão da bruma.

Mas, súbito um clarão a espessa treva inflama,
Acende o mar bravio, ilumina os escolhos,
E guia o rumo às naus contra os parcéis da morte...

É a vida! É o farol que escancarando os olhos,
Vira e revira em torno as órbitas de chama,
Ora ao Norte, ora ao Sul, ora ao Sul, ora ao Norte...


(Victor Silva)

6 de fev. de 2013

Um enevoamento extasiado


Um enevoamento extasiado
Grassa na matéria
Minha existência cansada

Chove da vida a lonjura
Imo de chovido permanecer
Gota d'água a cair pesada

E a nebulosidade na delonga
Faz pensar qué cavo esse viver;

Do SONHO toda a mironga
De quem a graça é se perder


(Cássio D. Versus)

Veracidade


"Poeta humano, egoísta, e presunçoso, a vangloriar o pôr-do-sol com suas rimas, que para muitos representa o fim da noite. Poeta humano, qu'é reles e indecoroso, a envaidecer a especiosidade do verão despencado, que para muitos tomba como desvairada seca. Amaldiçoado seja o poeta humano, sem profundezas realísticas, a versejar o vento leve que sopra em suas pestanas, sem vê-lo transformar-se no tufão que devasta as campinas. Poeta humano, eternamente esnobe com seu nojoso complexo de superioridade virtuosa, a poetisar e silenciar, em covardes louvores de palavras esnobes, a mulher amada, que para outro talvez valha muito mais que um poema..."


(Cássio D. Versus)

Arahant




Sozinho
é ninho
de inho
sem dó

Sozinho
é adivinho
de alinho
sem nó

Sozinho
é figueirinho
de alvarinho
sem aló

Sozinho
é meirinho
de ribeirinho
sem dató

Sozinho
é caminho
de alinho
sem godó


só só
só só só
só só só só
só só só só só
só só só só só só

tá feita a minha casa


(Cássio D. Versus)