20 de fev. de 2025

Elegia de um Cadáver


Onde estou, o tempo não pulsa. Há um silêncio absoluto, como se o universo tivesse retido a respiração. Minha última memória é tua voz, um sussurro de promessa — ou seria um adeus mascarado? — antes que o véu da existência me fosse arrancado. Não sei quanto tempo faz. O que é o tempo para quem já não vive? Sei apenas que espero. Espero por ti como se cada instante pudesse redimir o vácuo que me habita. Espero, mesmo sem saber se meu nome ainda repousa na tua língua, ou se o vento já o apagou das páginas da tua vida.

Os vivos têm a crueldade de seguir em frente. Eles desatam os laços como quem desfaz nós em cordas, esquecendo que para quem parte, a eternidade é um ciclo de perguntas sem respostas. Ainda te espero, acreditando na promessa do teu toque, na doce ilusão de que há um lugar onde nossos caminhos se cruzarão de novo. Mas no fundo, algo sussurra que fui esquecido. Que o amor que ardeu em mim, como chama voraz, foi apagado com a frieza de uma lâmina molhada. Que na tua vida há outro nome, outro sorriso, enquanto eu definho num esquecimento que sequer posso entender.

E então percebo: a maior tragédia de quem morre não é o silêncio da morte, mas a ausência de um luto verdadeiro. É não saber que foi abandonado, e continuar amando uma sombra que há muito deixou de existir.


(Cássio D. Versus)

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