26 de fev. de 2025

A luz precisa de rachaduras para entrar


Som de pneus no asfalto molhado
e eu queria cair aos prantos
falar com os santos sobre as rachaduras do meu telhado

Tudo o que eu faço é sobre esconder o que sou, tentar achar um equílibrio insano (?) entre demônio e anjo, cansei de trabalhar com os dois na verdade, estou à procura de uma nova identidade, forças diferentes e novas que andei descobrindo pelos últimos anos mas não me permiti nem ao menos a experiência de saber qual o gosto da alternativa subliminar. Daqui me parece tão familiar, o cheiro e textura são convidativos apesar de casualmente assustadores. Ser um bom filho é questão de timing, ser uma boa pessoa é questão de timing, as vezes me pergunto por onde andam os meus demônios já que os anjos deixaram penas levemente umedecidas em sangue para eu não ficar atordoado com a densa neblina de suas ausências. Cansei de um Versus de joelhos no descontentamento, cansei de um Versus decepcionado com a própria amargura. Eu me dava tão bem com meus defeitos e anomalias. Cansei de sorrisos falsos quando em suma a lágrima sincera me representa melhor. - A Solidão é um ímã do Universo te puxando para a Verdade de Si. - Fugimos da escuridão mas a buscamos diariamente com escolhas e aberturas em circunstâncias totalmente inverossímeis para o padrão de espiritualidade cuspida pelos vãos, fragilizados pelo próprio Ego. É necessário permitir que o frio entre as vezes galopando em névoas tropeçando nas janelas desarticuladas - essa minha janela que dá de cara para os meus segredos milagres e orações.

"Sombrio vale! Não vejo nada
Senão a névoa que toca o vento." - Manuel Bandeira

 

22 de fev. de 2025

Três Coisas


o medo mata a gente

a Verdade liberta a mente

ninguém é inocente.


(D. Vs)

Quietude

 
eduque-se
mantenha a postura

não se apresse
não se precipite

na dúvida, pare
não custa nada verificar

pode até ser divertido
quando tudo está baldio


(D. Versus)

20 de fev. de 2025

Elegia de um Cadáver


Onde estou, o tempo não pulsa. Há um silêncio absoluto, como se o universo tivesse retido a respiração. Minha última memória é tua voz, um sussurro de promessa — ou seria um adeus mascarado? — antes que o véu da existência me fosse arrancado. Não sei quanto tempo faz. O que é o tempo para quem já não vive? Sei apenas que espero. Espero por ti como se cada instante pudesse redimir o vácuo que me habita. Espero, mesmo sem saber se meu nome ainda repousa na tua língua, ou se o vento já o apagou das páginas da tua vida.

Os vivos têm a crueldade de seguir em frente. Eles desatam os laços como quem desfaz nós em cordas, esquecendo que para quem parte, a eternidade é um ciclo de perguntas sem respostas. Ainda te espero, acreditando na promessa do teu toque, na doce ilusão de que há um lugar onde nossos caminhos se cruzarão de novo. Mas no fundo, algo sussurra que fui esquecido. Que o amor que ardeu em mim, como chama voraz, foi apagado com a frieza de uma lâmina molhada. Que na tua vida há outro nome, outro sorriso, enquanto eu definho num esquecimento que sequer posso entender.

E então percebo: a maior tragédia de quem morre não é o silêncio da morte, mas a ausência de um luto verdadeiro. É não saber que foi abandonado, e continuar amando uma sombra que há muito deixou de existir.


(Cássio D. Versus)